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segunda-feira, 27 de setembro de 2021

OS CASOS DOS “DE HAVILLAND COMET” E DO “BOEING 737 MAX” E OS PERIGOS E DESAFIOS DAS INOVAÇÕES NA AVIAÇÃO COMERCIAL

  Autor: Luiz Reis


Nos últimos meses, dois graves acidentes, um na Indonésia no dia 29 de outubro de 2018, com 189 mortos, e outro na Etiópia no dia 10 de março de 2019, com 157 mortos, chocaram o mundo e arranharam profundamente a imagem de um dos ícones da aviação comercial mundial, o Boeing 737. 


Considerada uma aeronave extremamente segura, os dois acidentes ainda estão sendo investigados e suas causas, apesar das muitas coincidências que envolvem as duas fatalidades, ainda continua um mistério.

Tais acidentes puseram em xeque tanto o futuro do atual modelo fabricado, o 737 MAX, que foi “groundeado” (retido no solo e proibido de voar) poucos dias depois do acidente na Etiópia, quanto também a própria reputação da Boeing Airplane Company, que suspendeu a venda do modelo e está até sendo investigada pelo FBI (Federal Bureau of Investigation; Bureau Federal de Investigações, em tradução livre) norte-americano pela precipitação em se lançar e certificar um modelo com falhas tão graves como as ocorridas.


Apesar de chocante e inaceitável pelo público geral, acidentes de aeronaves comerciais e militares recém-lançadas ou em início de vida operacional não é algo novo na História da Aviação Comercial, aonde, ao longo das décadas desde o surgimento dos primeiros voos comerciais, muitos incidentes e acidentes mancharam a reputação de muitos bons modelos criados, mas seus acidentes e os resultados das investigações levaram a melhorar a qualidade das aeronaves modernas e da segurança de voo.

Esse texto vai ressaltar dois casos em particular: o caso do de Havilland Comet, a primeira aeronave comercial a jato construída e do próprio Boeing 737. Ambas as aeronaves apresentaram grandes inovações aeronáuticas e uma, pelos acidentes ocorridos, resultou em um grande fracasso comercial, mas que auxiliou muito o aprendizado sobre a produção e a operação de aeronaves a reação. A outra, um grande sucesso comercial, na sua quarta geração enfrenta problemas sérios que podem custar inclusive o fim de sua produção.

DE HAVILLAND COMET

Após a II Guerra Mundial, os Aliados, incluindo a Inglaterra, tiveram acesso a diversos dados sobre estudos aerodinâmicos realizados pela Alemanha, vários deles estavam voltados para o uso de asas em enflechamento positivo e uso de motores a reação em aviões, estudos esses que influenciariam a construção de várias aeronaves comerciais e militares na segunda metade dos anos 1940 e na década de 1950.

O “Comitê Brabazon” (Brabazon Committe), que iniciou os estudos de novas aeronaves (comerciais e militares) para a Inglaterra ainda durante a guerra, coordenou esse processo, solicitando aos fabricantes aeronáuticos ingleses, novos desenhos e propostas de aeronaves, de preferência pressurizadas e a jato, para se obterem as vantagens do uso desse tipo de aeronave, como o voo em grandes altitudes e a velocidades próximas da supersônica.


Uma das primeiras propostas foi apresentada pelo membro do comitê Sir Geoffrey de Havilland, fundador da “de Havilland Company”, que usou sua grande influência perante o governo britânico e sua experiência em desenvolver aeronaves de sucesso (como o caça-bombardeiro de Havilland Mosquito, feito quase inteiramente de madeira), tendo sua proposta adotada, com o modelo sendo chamado inicialmente de “Type 106”, em fevereiro de 1945, posteriormente sendo chamada de “DH 106 Comet” (Cometa).

A proposta era tão avançada que os motores a jato propostos nem haviam sido produzidos, seriam desenvolvidos paralelamente ao desenvolvimento da fuselagem. As especificações, segundo o próprio de Havilland, seriam atingidas, que voaria a uma altitude de 40 mil pés (cerca de 12.192 metros) numa velocidade de cruzeiro de cerca de 460 milhas por hora (740 km/h), além da possibilidade de se fazer a travessia transatlântica entre Londres e Nova York com poucas escalas (distância de 5.567 km, usando a ilha dos Açores, em Portugal e o aeroporto de Gander, no Canadá, como prováveis escalas para reabastecimento).


O desenho final da aeronave foi escolhido em 1947, com uma célula com capacidade para 36 passageiros, com asas de enflechamento de 20 graus e com quatro motores embutidos, dois em cada asa (inicialmente o Hatford H.1 Goblin nos protótipos e posteriormente o mais potente Hatford H.2 Ghost nos modelos de produção). A BOAC (British Overseas Airways Corporation) principal empresa britânica (antecessora da atual British Airways) e a antiga British South American Airways (uma subsidiária da BOAC para a América do Sul e Caribe) encomendaram um total de 14 aeronaves, com entregas previstas para 1952.

O primeiro protótipo do Comet (Comet 1 registro G-ALVG) foi completado no início de 1949 e teve o seu primeiro voo no dia 27 de junho de 1949. Após exaustivos testes devido as novas tecnologias existentes, acumulando cerca de 500 horas de voos experimentais, a primeira unidade de produção foi entregue em janeiro de 1951 a BOAC para treinamento das tripulações. A certificação de aeronavegabilidade da aeronave foi recebida cerca de um ano depois, em janeiro de 1952, com as operações iniciando em 02 de maio de 1952, numa rota cobrindo Londres a Johanesburgo, na África do Sul (com cinco escalas, duração total de 21 horas e 20 minutos!).


Mesmo com todo esse tempo o Comet era 50% mais rápido do que as antigas aeronaves a pistão, cruzando os céus sem turbulência por voarem a grande altitude, propiciando grande conforto aos passageiros, graças a cabine pressurizada. A pouca manutenção e o baixo consumo de combustível após 30 mil pés de altitude (9.144 metros de altura) surpreenderam a BOAC. As principais rotas servidas pelos oito Comet da BOAC em 1953 eram Londres – Johanesburgo, Londres – Tóquio, Londres – Nova York, Londres – Cingapura e Londres – Colombo.

No primeiro ano de operação, o Comet transportou cerca de 30.000 passageiros, se tornando a viagem dos sonhos para as pessoas que pudessem adquirir uma cara passagem dessas aeronaves, com um serviço de bordo 100% primeira classe, com muito glamour e conforto propiciado no início da era do jato. A então jovem rainha Elizabeth II, acompanhada da Rainha-Mãe Elizabeth e sua irmã, a Princesa Margaret, voaram num Comet 1 no dia 30 de junho de 1953 e se tornaram os primeiros membros da família real a voarem numa aeronave a jato.

Em 1953, o Comet 1 era um grande sucesso, com várias encomendas recebidas de empresas da França, Japão, Venezuela, Índia, Estados Unidos e inclusive do Brasil (a Panair do Brasil). Versões mais modernas, alongadas e com maior capacidade de combustível (Comet 1A e Comet 2, esse último equipado com os motores mais poderosos Rolls-Royce Avon) estavam sendo projetadas e oferecidas no mercado. 


Tudo indicaria que o Comet seria um grande sucesso, mas terríveis fatos surgiriam nos próximos anos para derrubar essa projeção. No dia 26 de outubro de 1952, o Comet sofreu o seu primeiro acidente com perda total da aeronave, o G-ALYZ da BOAC, que não conseguiu decolar e varou o final da pista do Aeroporto de Ciampino, Roma. 

Não houve vítimas fatais, mas a aeronave foi destruída. No dia 03 de março de 1953 um Comet 1A, que seria entregue a empresa Canadian Pacific Airlines, caiu durante o seu voo de translado, quando tentou decolar sem sucesso na Austrália e também varou a pista. A aeronave foi destruída e todos os 11 passageiros e tripulantes morreram no acidente. Ambos os acidentes foram provocados por falha humana, segundo as investigações.

No dia 02 de maio de 1953 ocorreu o terceiro acidente do Comet (e o segundo fatal) quando o G-ALVY da BOAC, cumprindo o voo 783, caiu seis minutos após decolar de Calcutá, na Índia, durante uma tempestade, morrendo todos as 43 pessoas a bordo. A investigação indiana concluiu que as forças que atuaram na aeronave durante a tempestade (provavelmente uma forte ventania) foram as causas do acidente, sem levar em consideração fatores estruturais ou de fadiga de material. Como consequência desse acidente, todos os Comet foram equipados com radar meteorológico.

Em 1954 ocorreram dois graves acidentes fatais, em um curto espaço de tempo e praticamente da mesma forma, que praticamente criou uma má fama ao aparelho e sepultou suas vendas e reputação. No dia 10 de janeiro de 1954, 20 minutos depois de decolar do Aeroporto de Ciampino, em Roma (o mesmo local do primeiro acidente do Comet), o Comet 1 matrícula G-ALYP da BOAC, cumprindo o voo 781, se despedaçou no ar e caiu próximo a Ilha de Elba, matando todos as 35 pessoas a bordo. 

Após o acidente, a BOAC suspendeu os voos do modelo e manteve voluntariamente a frota em solo, aguardando o resultado das investigações.


Cerca de três meses depois do acidente do G-ALYP, no dia 08 de abril, o Comet 1 G-ALYY ,da South African Airways, no voo 201, entre Londres e Johanesburgo, caiu também poucos minutos após decolar de Roma, no Mar Mediterrâneo, próximo a Nápoles, matando todas as 21 pessoas a bordo. 

A aeronave também se despedaçou no ar e os corpos e destroços se espalharam por uma grande área. Após esse acidente o certificado de aeronavegabilidade da aeronave foi cassado e o Primeiro-Ministro inglês Winston Churchill pessoalmente ordenou que se fizesse o possível para encontrar as causas do acidente.

Para isso foi realizada uma grande investigação liderada pelo Comitê Cohen (Cohen Committee), liderado pelo Lord Cohen, que iniciou uma profunda investigação dos dois acidentes, além de investigar outros acidentes e incidentes que o Comet sofreu ao longo de sua curta vida operacional. 

Um Comet 1 da BOAC, matrícula G-ALYU foi doada pela empresa para análise e colocada num tanque de água para simular pressurização e despressurização da aeronave (os chamados ciclos). No dia 24 de junho, após 3.057 ciclos (1.221 reais e 1.836 simulados), a célula do G-ALYU se rompeu, praticamente no mesmo tempo do que as aeronaves acidentadas.

Estudos realizados pelos engenheiros ingleses determinaram que a causa do rompimento foi um acúmulo anormal de fadiga nas laterais das grandes janelas quadradas da aeronave, que não aguentavam a pressão e se rompiam. A análise do que aconteceu com o G-ALYP (dois terços da aeronave foram retirados do fundo do mar e reconstruídos para análise) comprovou o que realmente aconteceu e as causa dos dois acidentes foi finalmente descoberta. Para evitar tais acidentes, as aeronaves passaram a arredondar mais os cantos das janelas, tornando-se ovais, além de reforçar mais a sua estrutura.

Não houve responsáveis pelas tragédias, até porque não havia como prever nem evitar tais desastres, já que a tecnologia era extremamente revolucionária e praticamente inédita. Mesmo com as descobertas da causa do acidente e a posterior aplicação das medidas necessárias, o Comet tornou-se uma aeronave “marcada” e não mais fez o sucesso que fazia antes dos acidentes. 

Os remanescentes Comet 1 e 1A foram desativados ou modificados com as janelas ovais e os posteriores Comet 2, 3 e 4 voaram por muitos anos com poucos incidentes ou acidentes, geralmente causados por erros dos pilotos, mas por causa dos graves problemas iniciais, apenas 114 aparelhos foram construídos.

A RAF (Força Aérea Real) da Inglaterra operou tanto alguns Comet para transporte até a década de 1970, quanto operou o Hawker Siddeley Nimrod, uma aeronave de patrulha marítima que foi baseada amplamente no Comet, construída pela Hawker Siddeley, que comprou a de Havilland Company em 1963. O Nimrod operou com a RAF até 2011, com grande sucesso.

BOEING 737

Lançado em 1964 com o objetivo de ser uma aeronave de baixo custo operacional para rotas curtas, de fuselagem estreita (narrowbody), o Boeing 737 tornou-se uma grande família de aeronaves, com dez variantes de quatro gerações diferentes. 


É a aeronave comercial mais vendida da História, com 10.478 unidades entregues (até janeiro de 2019), e a menor aeronave hoje em produção pela Boeing. Essa aeronave substituiu diversos modelos ao longo dos anos, incluindo o Boeing 707, Boeing 717, Boeing 727, Boeing 757 e McDonnell Douglas DC-9. Compete principalmente com a família do Airbus A320.

O primeiro voo da versão inicial do 737, o 737-100 (a mais curta versão do 737 já fabricada) foi no dia 09 de abril de 1967. Entrou em serviço no dia 10 de fevereiro de 1968, com a companhia alemã Lufthansa. 

A segunda versão fabricada, a 737-200, alongada e com motores mais potentes, entrou em operação no dia 28 de abril de 1968. Essa última versão foi a preferida das companhias aéreas e foi produzida em quantidade muito maior do que a versão original -100 (foram produzidos 30 737-100 e 1.095 737-200).
A versão 737-200 foi operada pela Força Aérea dos Estados Unidos (USAF), para treinamento de navegadores e transporte (Boeing T/CT-43 Gator). 


A Força Aérea da Indonésia operou uma versão do 737-200 modificada para patrulha marítima e transporte (designada de 737-2x9 Surveiller). A nossa Força Aérea Brasileira (FAB) operou por muitos
anos dois 737-200 na versão VIP (transporte de autoridades), sendo designados de VC-96 e infamemente apelidados de “sucatinhas” (devido ao também utilizado Boeing 707 KC-137, chamado de “sucatão”). Outros países também operaram a versão -200, principalmente como transporte.

Na década de 1980 foi lançada uma nova versão do 737. Essa versão seria equipada com motores mais modernos (os turbofans da CFM International), além de um aumento no comprimento da aeronave, uma asa e derivas redesenhadas e a instalação de instrumentos de navegação mais modernos. 

Essa versão seria conhecida como 737-300 e teve o seu primeiro voo no dia 24 de fevereiro de 1984, entrando em serviço em 28 de novembro de 1984. Foram produzidos 1.113 Boeing 737-300.

Outras versões do 737 foram desenvolvidas, formando a chamada família “737 Classic”, configurando a segunda geração do modelo.


O 737-400, uma versão mais alongada do que o -300, teve seu voo inicial no dia 19 de fevereiro de 1988 e entrou em serviço em outubro do mesmo ano. A versão 737-500, considerada uma substituição moderna da versão -200, com um comprimento semelhante, mas com um consumo 25% menor, devido aos modernos turbofans.

Essa versão voou no dia 30 de junho de 1989 e entrou em serviço no dia 28 de fevereiro de 1990. Foram produzidos, respectivamente, 486 737-400 e 389 737-500. Muitos dos -400 hoje operam convertidos para cargueiros, mas ainda há muitos modelos dessa família ainda operando com voos de
passageiros. 

Após o lançamento do seu principal concorrente, o Airbus A320, a Boeing iniciou o desenvolvimento de uma versão melhorada em 1991. Após consultar clientes em potencial, a versão “Next Generation” (NG) foi anunciada no dia 17 de novembro de 1993. Essa versão engloba as versões -600, -700, -800 e -900, formando a terceira geração do modelo. O desempenho dessa nova família é semelhante ao de uma nova aeronave, porém foram conservadas características das outras versões anteriores.

A asa foi redesenhada, com um novo perfil aerodinâmico (aumento da envergadura em quase cinco metros), tornando-a mais comprida (aumentando a quantidade de combustível) e também equipada com “winglets” (pequenas derivas verticais). 


Novos motores da CFM International, mais eficientes e econômicos, aliados às melhorias aerodinâmicas, elevou o alcance da aeronave para quase seis mil quilômetros, podendo inclusive realizar viagens transatlânticas, já que também recebeu a certificação ETOPS (que homologa a aeronave para voo monomotor) de até 120 minutos. Também recebeu modernos instrumentos de navegação e um cockpit com cinco grandes telas multifunções de LCD (o chamado “glass cockpit”).

O primeiro protótipo da família 737 NG foi apresentado em fins de 1996 e voou em fevereiro de 1997, um 737-700 (substituto do 737-300). A versão 737-800, que substituiu a versão 737-400, voou pela primeira vez em julho de 1997. Já a versão 737-600, que substituiu a 737-500, voou em fins de 1997. Além dessas versões, a Boeing lançou as versões 737-900 (primeiro voo em 2001) e 737-900ER (Extended Range, ou “Alcance Aumentado”, que voou pela primeira vez em 2007), as versões mais compridas e com maior capacidade de passageiros da família, podendo acomodar até 215 passageiros em classe única.

Em 2004, após solicitação da companhia aérea brasileira Gol Linhas Aéreas Inteligentes, a Boeing passou a oferecer o pacote SFP (Short Field Performance, ou “Performance em Pistas Curtas, em tradução livre), que melhora o desempenho da aeronave em pousos e decolagens em pistas curtas, sendo esse pacote posteriormente oferecido aos demais clientes da Boeing, como opcional nas versões -800 e -900 e já equipado automaticamente na versão -900ER. Foram entregues, até o momento (fevereiro de 2019) 6.938 aeronaves comerciais dos quatro modelos da família 737 NG, estando os modelos ainda em produção. 


Além dos modelos comerciais, a Boeing também comercializa modelos militares baseados no 737 NG: o 737 AEWC (uma versão de Alerta Aéreo Antecipado e Controle, baseado no 737-700ER, também conhecido como Boeing E-7A Wedgetail), o C-40 Clipper (uma versão do 737-700 Combi operada pela Marinha dos Estados Unidos – USN e pela Força Aérea dos EUA – USAF) e o P-8 Poseidon ou P-8I Neptune (uma versão de patrulha marítima do 737-800ER com as pontas das asas do Boeing 767-400ER).

A Boeing também oferece uma versão do Boeing 737 como aeronave de transporte executivo e de autoridades, o Boeing Business Jet (BBJ). O BBJ1 é baseado no 737-700, o BBJ2 é baseado no 737-800 e o BBJ3 é baseado no 737-900ER. Alguns países usam o BBJ em suas forças aéreas para transporte VIP ou presidencial. No total foram 151 unidades das três versões do BBJ entregues até o presente momento.

Em agosto de 2011, logo após a concorrente Airbus lançar a versão A320neo, com novos motores e sistemas mais econômicos e eficientes, é lançada a quarta geração do 737, o “Boeing 737 MAX”, que sucedeu o 737 NG. As principais modificações da família MAX foram motores mais eficientes e modificações na estrutura das aeronaves. Equipadas com as novas turbinas CFM International LEAP, capazes de redução de consumo de combustível em média de 15% em relação a família 737 NG.

O primeiro 737 MAX apresentado (um 737 MAX 8, substituto de 737-800) foi apresentado em dezembro de 2015, com o primeiro voo no dia 29 de janeiro de 2016 (quase 49 anos depois do primeiro voo de um 737, um 737-100 no dia 09 de abril de 1967). A versão 737 MAX 9 voou pela primeira vez em 29 de abril de 2017 e entrou em operação em 21 de março de 2018. As outras versões (737 MAX 7, 10 e 200) estavam previstas para voar ainda em 2019, com entrada em serviço em 2020. A Boeing tem o total de 5.012 encomendas da versão MAX até o momento (março de 2019), com 376 aeronaves dos modelos MAX 8 e MAX 9 entregues.

Era uma aeronave que estava tendo grande sucesso, assim como as versões anteriores da família 737, mas começaram a acontecer alguns incidentes e acidentes que arranharam a imagem da fabricante e colocou em xeque o futuro da aeronave.

Em 29 de outubro de 2018, um Boeing 737 MAX 8, matrícula PK-LQP, da empresa “low-cost” (baixo custo) da Indonésia Lion Air caiu no Mar de Java minutos depois de ter decoladodo Aeroporto Internacional Soekarno–Hatta, Jacarta, Indonésia em direção ao Aeroporto Depati Amir na cidade de Pangkal Pinang, Indonésia. O acidente vitimou as 189 pessoas que seguiam a bordo, incluindo passageiros e tripulação. Segundo comunicado oficial da empresa, o avião era novo, estando em operação há apenas três meses, sendo que o piloto e copiloto que seguiam a bordo somavam no total mais de onze mil horas de voo. Informações preliminares apontaram que poderia ter havido uma falha no medidor de velocidade da aeronave, o que pode ter contribuído para a queda.

Em 14 de dezembro de 2018, um Boeing 737 MAX 8 registrado com a matrícula LN-BKE, que fazia o voo 1933 da Norwegian Air Shuttle em um voo de Dubai, Emirados Árabes Unidos para Oslo, Noruega, foi forçado a fazer um pouso de emergência em Shiraz, Irã depois de um defeito no motor esquerdo. Alguns dias depois, no dia 06 de janeiro de 2019, um 737 MAX da SpiceJet, cumprindo o voo 32 de Hong Kong para Nova Delhi sofreu uma falha de motor, tendo que fazer um pouso de emergência.

Em 10 de março de 2019, um Boeing 737 MAX 8 registado com a matrícula ET-AVJ, que fazia o voo 302 da Ethiopian Airlines, uma ligação regular entre Addis Abeba e Nairóbi no Quénia, caiu pouco depois de decolar. O avião tinha entrado ao serviço em dezembro de 2018. Todos os 149 passageiros e oito tripulantes a bordo morreram. Segundo testemunhas e informações preliminares, a aeronave mergulhou de bico para o solo, praticamente desintegrando-se, em grande velocidade.

No dia 12 de março, depois de dois acidentes com a aeronave, que mataram 346 pessoas, o novo avião de passageiros Boeing 737 MAX 8 foi classificado pelas autoridades de aviação e companhias aéreas em todo o mundo com “falta de aeronavegabilidade”, ou seja, a aeronave não está mais pronta para voar por razões técnicas e deve permanecer no solo, groundeado, até que o fabricante descubra o problema. Na arena militar não houve mudanças nem alertas, pois não há nenhum Boeing 737 miliar baseado na família MAX, e sim na anterior, a NG, portanto, sem alterações significativas.

Agora a pergunta: Por que tantos problemas, incluindo dois acidentes fatais, numa aeronave novíssima em folha, com apenas poucos meses de operação? A resposta está nesse texto abaixo, retirado da revista Superinteressante: “Quando a Boeing desenvolveu a última geração do avião (batizada de “MAX”), os motores cresceram tanto que remanejar os equipamentos em torno deles não era mais suficiente. Então, a empresa resolveu colocá-los alguns centímetros para frente da asa e, com isso, deixá-los levemente mais altos. O truque funcionou, mas engenheiros detectaram que isso fazia com que avião tivesse uma pequena tendência de elevar o nariz sem que os pilotos precisassem tocar nos comandos. Em certos casos – sobretudo durante as decolagens –, essa situação poderia fazer com que o 737 perdesse sustentação (estol) e caísse. 

Por causa disso, a Boeing incluiu no 737 MAX um software chamado MCAS (sigla para sistema de ampliação de característica de manobra, em inglês). Ao detectar o risco de estol, o MCAS altera o ajuste de uma peça chamada trim para abaixar o nariz do avião e manter a sustentação. Foi aí que começou a sequência de erros da Boeing. O primeiro é que o MCAS não dá nenhum alerta na cabine de que entrou em ação. E o ato dos pilotos puxarem o manche (o que faz com que o avião volte a subir) não inibe o funcionamento do software de correção. A cereja do bolo: a Boeing não avisou aos seus clientes da existência do MCAS, e não incluiu os procedimentos de inibição do software no manual de operação do 737 MAX.” (Revista Super Interessante. Como 50 anos de remendos tornaram o Boeing 737 perigoso. Editora Abril, 2019).

Ou seja, o MCAS provavelmente pode ter derrubado as duas aeronaves, pois com ele acionado inadvertidamente e sem o conhecimento dos pilotos, eles nada podiam fazer para evitá-los. E para piorar a situação, durante o processo de certificação da aeronave, autoridades aeronáuticas dos Estados Unidos e da Europa não consideraram a presença do MCAS e consideraram que um piloto que voava o 737 NG, a geração anterior, poderia voar tranquilamente o 737 MAX sem um treinamento específico.


No Brasil, a ANAC (Agência Nacional de Aviação Civil) reconheceu a presença do MCAS no 737 MAX como uma diferença na pilotagem em relação ao 737 NG, e exigiu do fabricante treinamento específico para o MAX. Com isso os pilotos brasileiros saberiam o que fazer caso o MCAS fosse acionado inadvertidamente e poderiam tranquilamente evitar a queda do aparelho.

Segundo relatos, o piloto e o copiloto do 737 MAX da Lion Air que caiu na Indonésia estavam consultando o manual da aeronave para saber como proceder naquela situação, no momento da queda da aeronave, portanto, não tinham treinamento necessário para lidar com a situação e comprova que era realmente necessário um treinamento específico para operar a mesma.

Portanto a situação está sendo investigada, com a Boeing prometendo novas atualizações no software da aeronave. Como já foi dito, o FBI norte-americano entrou na investigação e quer saber se houve precipitação no processo de certificação da aeronave pelas autoridades dos EUA e Europa. Enquanto isso, centenas de aeronaves 737 MAX estão paradas em diversos aeroportos espalhados pelo mundo, gerando milhões de dólares de prejuízos e fazendo com que a Boeing cada dia mais perca valor de mercado.

Em meados de 2019, a Boeing praticamente suspendeu a fabricação do 737 MAX devido a falta de entregas e o grande número de aeronaves prontas acumuladas em suas fábricas. Essa situação continuou até meados de 2020, também como consequência da Pandemia do Novo Coronavírus (COVID-19). Entre 29 de junho e 1º de julho de 2020, a FAA e a Boeing realizaram uma série de voos de teste de recertificação. Transport Canada e EASA concluíram seus próprios voos independentes de recertificação no final de agosto e início de setembro de 2020.

Em 19 de agosto de 2020, a Boeing anunciou que havia recebido novos pedidos para o 737 MAX pela primeira vez em 2020. De acordo com um comunicado da empresa, a polonesa Enter Air SA celebrou um acordo para comprar até quatro 737. A Boeing se referiu ao aviãocomo um “Boeing 737-8” em uma mudança da marca Boeing 737 MAX, para apagar a marca antiga com os acidentes e incidentes ocorridos.

Em 18 de novembro de 2020, a FAA anunciou que o 737 MAX havia sido liberado para retornar ao serviço. Antes que a aeronave possa retomar o serviço, os reparos devem ser implementados de acordo com uma diretiva de aeronavegabilidade futura da FAA. 

Os programas de treinamento de companhias aéreas também exigem aprovação. Espera-se que os voos de passageiros sejam retomados nos EUA até o final do ano; as entregas podem ser retomadas e a produção deve aumentar lentamente. A Boeing viu mais de mil cancelamentos de pedidos desde o encerramento em março de 2019. Algumas dessas aeronaves já construídas tiveram seus pedidos cancelados e a Boeing está trabalhando para encontrar novos clientes para receber a entrega. 

A primeira companhia aérea a retomar o serviço regular de passageiros foi a brasileira GOL, em 9 de dezembro de 2020. A primeira nos Estados Unidos foi a American Airlines em 29 de dezembro. Em 2021 é esperado que outras empresas coloquem os seus 737 MAX em voo ou recebam da Boeing.

Mesmo com essa retomada dos voos do 737 MAX é importante as autoridades aeronáuticas manter a fiscalização e o rígido cumprimento dos processos de certificação aeronáuticos do 737 MAX e também de futuras aeronaves. 

O que aconteceu com os Comet nos anos 1950 e com os 737 MAX no final de 2018 e no início de 2019 são alertas de que inovações são perigosas e tem que se profundamente estudadas com a pena de acontecerem tragédias como as ocorridas há mais de 50 anos atrás e as que aconteceram dias atrás.

Antonov An-22 Antei: o maior avião turboélice da história

Durante o período da Guerra Fria, os soviéticos produziram dezenas de aeronaves muito interessantes sob qualquer ponto de vista, usando tecnologia diferente da usada no Ocidente, embora fossem frequentemente acusados de copiar tecnologia aeronáutica estrangeira.
Antonov An-22

O Antonov An-22 Antei, no entanto, não foi copiado de nenhum modelo ocidental, sendo, ao contrário, muito inovador em muitos aspectos, já que foi o primeiro avião de carga de fuselagem larga, e que ainda mantem o titulo de maior avião turboélice da história.

No período entre o final da década de 1950 e o início da de 1960, os soviéticos operavam os cargueiros turboélices Antonov An-8 e An-12, aeronaves muito eficientes, mas havia a necessidade de uma aeronave ainda maior. Nessa época, motores a jato ainda não dispunham de muito empuxo, além de consumir combustível demais, o que limitava tanto o peso quanto a autonomia. Motores turbofans, mais eficientes, ainda eram incipientes. Felizmente, os soviéticos tinham à disposição os poderosos motores turboélices Kuznetsov NK-12, de 15 mil SHP, que equipavam os bombardeiros Tupolev Tu-95.
Um Antonov An-22 na aproximação

Os motores NK-12 eram máquinas equilibradas, econômicas e muito eficientes, sendo considerados até hoje como sendo os motores turboélices de melhor relação potência/consumo, embora sua tecnologia remonte aos anos 1950. Confira aqui no blog o artigo publicado sobre o motor Kuznetsov NK-12.

O An-22 consome cerca de 6 toneladas de combustível por hora, bem menos que qualquer jato de porte equivalente.
O painel principal de instrumentos do AN-22

A concepção de um novo cargueiro foi simplificada ao máximo, e a estrutura era bastante convencional, baseada no modelo An-12, mas muito ampliada. Uma diferença importante em relação ao An-12 era a cauda dupla
Vista frontal do An-22

A missão militar prevista para o novo avião era o transporte estratégico, o que incluía lançamento ou transporte de tropas, transporte de veículos militares ou até mesmo de mísseis.

O projeto, então denominado An-20 começou com a montagem de um mock-up em madeira nas instalações da Antonov em Kiev, na Ucrânia. Era, assim como os modelos An-8 e An-12, uma aeronave de asa alta, quadrimotora, com capacidade de operar em pistas não pavimentadas e não preparadas, uma condição essencial para as condições então existentes na União Soviética. 
O enorme compartimento de carga do An-22

Nos primeiros aviões, a pressão dos pneus podia ser ajustada em voo para atender aos imediatos requisitos de pista e peso do avião, mas tal recurso foi abandonado depois. A aeronave precisava de apenas 1300 metros de pista para operar, apesar do seu grande tamanho e potência.
Vista lateral do An-22

Os quatro motores Kuznetsov NK-12, de 15 mil SHP, giravam hélices de 8 pás contra rotativas, sendo o conjunto de hélice instalado coaxialmente. As caixas de redução permitiam às hélices girar no máximo à 750 RPM. Essa combinação de motores potentes e hélices de baixa rotação conferiram ao avião um espetacular desempenho de cruzeiro, velocidade de 740 Km/h (400 Knots), alcance de 5 mil Km com carga útil máxima, e de até 10950 Km com combustível máximo e até 45 mil Kg de carga.
Pouso de um An-22 na Ucrânia

A fuselagem tinha seção circular, sendo o compartimento dianteiro totalmente pressurizado, e a seção de carga, de 33 metros de extensão e 639 metros cúbicos de capacidade com pressão diferencial mais baixa. Isso permitiu a redução do peso estrutural. A seção de carga tinha um sistema de pressurização próprio, com pressão diferencial máxima de apenas 3,55 PSI. Uma antepara de pressão instalada na caverna 14 da fuselagem tinha uma porta que dava acesso ao compartimento de carga pelo compartimento do loadmaster.
Posto do navegador do An-22, logo abaixo do cockpit principal

O avião, redenominado An-22 Antei (referente a Anteu, gigante da mitologia grega), era operado por uma tripulação de 5 pessoas, piloto, copiloto, mecânico de voo, operador de rádio e loadmaster. Podia levar até 29 passageiros na seção pressurizada dianteira.

O protótipo voou pela primeira vez em 27 de fevereiro de 1965, e foi apresentado ao público no Paris Airshow do mesmo ano, após fazer testes durante quatro meses, nos quais foram usados três protótipos. 68 aeronaves do tipo foram construídas na fábrica da Antonov em Tashkent, no Uzbequistão, com exceção dos protótipos, construídos em Kiev, na Ucrânia.

A primeira entrega militar, para a Força Aérea da União Soviética, foi em 1969. A Aeroflot também usou o tipo.

O primeiro uso do An-22 foi o envio de ajuda humanitária para o Peru, após um terremoto, em 1970, e uma das aeronaves, operada pela Aeroflot, acabou perdida durante essa missão.

A URSS também usou os AN-22 para levar material bélico para o Egito e para a Síria, durante a Guerra do Yom Kippur, em 1973, mas a aeronave também foi usada para outras missões humanitárias, como na Etiópia em 1984, quando uma grande seca assolou esse país. Outra missão importante do An-22 foi levar material para a Usina Nuclear de Chernobyl, em 1986, quando um dos reatores explodiu.

Durante os anos 1990, quarenta e cinco aeronaves ainda estavam em uso, principalmente na Força Aérea da Rússia,  mas já estavam bem usados e sendo substituídos pelos An-124 Ruslan.
Esse é o último An-22 ainda operacional
Atualmente, existem apenas 4 aeronaves An-22 ainda operacionais, sendo 3 da Força Aérea da Rússia e uma civil, operada pela Antonov Airlines a partir da sua base na Ucrânia, e matriculada UR-09307. A Força Aérea da Rússia ainda possui mais 3 aeronaves, mas atualmente não estão operacionais.

O An-22 tem o porte semelhante ao de um Boeing 767-200, mas é mais leve que essa aeronave, o que o torna o maior avião turboélice já fabricado. 


segunda-feira, 25 de janeiro de 2021

Os Boeing 757-200 da Varig: uma história de sucesso

 O 757 foi um projeto criado pela Boeing para substituir o seu já veterano Boeing 727,   que já dava sinais de cansaço, e consumia muito combustível, apesar das sua excelentes qualidades.


Ao mesmo tempo em que desenvolvia o 757, a Boeing projetava uma "resposta" ao Airbus A300, o primeiro avião de fuselagem larga bimotor, inicialmente desdenhado, mas que se provou ser um grande sucesso de mercado. Esse avião foi denominado como Boeing 767.

Interior do PP-VTQ

As duas aeronaves acabaram sendo desenvolvidas em conjunto, com vários pontos em comum, como a configuração geral e os cockpits tão parecidos que a qualificação era comum para os dois tipos.

Cockpit do PP-VTQ

O Boeing 757, depois de um início de carreira meio lento, acabou obtendo boas encomendas e foi um sucesso. o 757 não é um 737 melhorado, e sim um avião de desempenho muito melhor, ainda que usasse a mesma seção de fuselagem do 737. Tem alcance muito maior que o 737, e capacidade de fazer voos internacionais sem escala, além de ter um custo operacional 9 por cento mais baixo que o 737. Oura vantagem é poder operar tranquilamente em aeroportos quentes e/ou altos demais para os 737.

O PP-VTR na Cidade do México

Apesar do interesse que despertou na Transbrasil, o 757 demorou muito a operar em empresas aéreas brasileiras, e foi somente em 2004 que a Varig resolveu arrendar da ILFC 4 aeronaves usadas, anteriormente operados pela empresa espanhola Ibéria.

O PP-VTS em Curitiba

As aeronaves eram relativamente novas, apenas 5 anos de uso, e estavam em ótimas condições. Eram equipadas com motores Rolls-Royce RB-211-535E4 e foram configuradas para operação em linhas da América Latina e domésticas, com 20 poltronas de classe Executiva e 156 poltronas de classe Econômica, com um pitch confortável que tornou tais aeronaves as mais confortáveis em operação na Varig.



O primeiro avião, matriculado no RAB como PP-VTQ, foi entregue no dia 4 de agosto de 2004, e começou a operar no dia 22 de setembro no voo RG8631, que saía de Buenos Aires às 06 horas e 30 minutos, chegava em São Paulo às 09 horas e 5 minutos, e de lá seguia para Lima às 10 horas, como voo RG8936, onde chegava às 13 horas e 5 minutos. O voo de retorno saía de Lima às 13 horas e 55 minutos, como RG8937, chegava em São Paulo às 17 horas e 55 minutos, e às 21 horas e 15 minutos estava de volta em Buenos Aires.

O avião foi bem recebido pelos passageiros, já que era bem confortável e com pitch generoso entre as poltronas.

O PP-VTT em voo

O segundo avião, matriculado no RAB como PP-VTR, foi entregue em 25 de setembro de 2004, e foi colocado em serviço em outubro, sendo colocado no voo RG8942 para Caracas, às terças, quartas, sextas, sábados e domingos, e no voo RG8946 para Caracas e Aruba, às quintas e segundas.

Nariz do PP-VTT

O dois aviões restantes, matriculados no RAB como PP-VTS e PP-VTT, chegaram em dezembro de 2004, e passaram a operar outras rotas na América Latina, como Assuncion, no Paraguai, e em rotas domésticas, como, por exemplo, os voos RG8614/8615, que ligava Manaus a Buenos Aires, passando em Belém, Fortaleza, Recife, Salvador e Galeão.

Os Boeing 757 também substituíram aeronaves maiores em outras rotas internacionais, como Cidade do México, quando a empresa começou a ficar com problemas mais sérios. 

Decolagem do PP-VTR


A ILFC  arrendou as aeronaves por quatro anos, mas, à época, a Varig já enfrentava sérios problemas financeiros e operacionais e encerrou suas operações em 20 de julho de 2006. As aeronaves foram retomadas pela ILFC em 24 de agosto de 2006,

A Varig não foi a única operadora de Boeing 757 de passageiros no Brasil, pois a OceanAir operou uma aeronave, o PR-ONF, um pouco mais antigo, por algum tempo, Alguns 757 cargueiros permaneceram em uso no Brasil em outras empresas aéreas.

Embora tenha operado por pouco tempo, menos de dois anos, o avião é lembrado atá hoje como sendo muito confortável e confiável pelos tripulantes e passageiros.

AERONAVES BOEING 757-200 OPERADOS PELA VARIG (2004/2006):

PP-VTQ: Boeing 757-256 - c/n 26247/860. Primeiro voo em 06/04/1999. Entregue à Ibéria em 20/04/1999 como EC-GZY. Devolvido à ILFC, Em 04/08/2004 foi para a Varig como PP-VTQ. Retomado pela ILFC em 08/2006 como N241LF. Arrendado em 11/2006 para a Kras Air como EI-DUA, e em 14/12/2009 para a I Fly Airlines. Em 30/09/2015 foi para a Icelandair, estando em processo de conversão em cargueiro, como TF-ISV.

PP-VTR: Boeing 757-256 - c/n 26248/863.Primeiro voo em 06/04/1999. Entregue à Ibéria em 30/04/1999 como EC-GZZ. Devolvido à ILFC, Em 25/09/2004 foi arrendado à Varig, como PP-VTR. Retomado em 08/2006 pela ILFC como N263LF, foi arrendado em 12/2006 para a Kras Air, como EI-DUC, e em 10/2009 para a I Fly Airlines. Em 01/04/2016 foi para a Icelandair como TF-ISR. Em operação.

PP-VTS: Boeing 757-256 - c/n 26249/881. Primeiro voo em 19/07/1999. Entregue à Ibéria em 16/08/1999. Devolvido à ILFC e arrendado à Varig como PP-VTS em 20/11/2004. Retomado pela ILFC, como N271LF, foi arrendado em 20/12/2006 para a Kras Air, e em 11/10/2009 para a I Fly Airlines, como EI-DUD. Foi para a Icelandair em 08/12/2015 como TF-ISJ. Estocado em Roswell, EUA, desde 19/11/2020.

PP-VTT: Boeing 757-256 - c/n 26250/889. Primeiro voo em 10/09/1999. Entregue à Ibéria em 02/09/1999. Devolvido à ILFC, foi em 04/06-/2004 para a Varig, como PP-VTT. Retomado em 08/2006 pela ILFC, como N272LF. Arrendado para a Kras Air em 04/02/2007 como EI-DUE. Estocado em 31/10/2008 em Domodedovo, Moscou

sexta-feira, 10 de maio de 2019

A vida de um piloto de linha aérea

Richard Fernandes

Manhã gelada de outubro, são 5 horas da manhã, no charmoso bairro de Vitacura, em Santiago do Chile. Me levanto, e me preparo para meu terceiro dia de trabalho, desde que deixei minha casa no Paraná. 
Antes de pousarmos aqui, na tarde de segunda-feira, iniciei o dia cedo, no domingo, indo de Guarulhos-SP a Campo Grande-MS, voltando a Guarulhos, e encerrando em Foz do Iguaçu-PR.

Ontem, foi Foz do Iguaçu à Guarulhos, para mais tarde ir a Santiago do Chile. Muita turbulência para alcançarmos nosso destino, devido à linha de instabilidade, que praticamente bloqueava nosso caminho sobre território argentino.
Agora, no check-out do hotel, vejo o simpático José, cidadão chileno, que fala muito bem o português, nos aguardando com sua van. Nessa hora da manhã, é um percurso de 30 minutinhos até o Aeroporto Internacional Arturo Merino Benitez. Na chegada, cumprimos todos os procedimentos padrão, assim como os passageiros: imigração, alfandega, raio-x e tanto os pilotos quanto os comissários despacham suas bagagens.

Encontramos o DOV (Despachante Operacional de Voo) na porta da aeronave, para um briefing sobre nossa viagem. Ele é responsável pela confecção do nosso planejamento de voo, dados como meteorologia ao longo da rota, possíveis aeroportos de alternativa, consumo estimado de combustível, cálculo de peso para decisão dos níveis de altitude que vamos voar e estudo dos ventos para, finalmente, decidir qual será a melhor rota. 
Temos, basicamente, três para São Paulo, e são primariamente decididas baseadas no nível de turbulência que possivelmente encontraremos ao cruzarmos as Cordilheiras. Esses dados são colhidos pela diferença de pressão que se tem entre Santiago e Mendoza. Quanto maior essa diferença, maior será a possível turbulência. Esse fenômeno único é conhecido por Ábaco de Harrison.

Temos 156 convidados essa manhã, sendo 12 na classe executiva, muito bom para uma aeronave com 154 assentos. Já na aeronave, precisamos de pelo menos 30 a 45 minutos para prepará-la. Os comissários preparam e checam todos os itens de segurança, limpeza e alimentação, antes que se inicie o embarque. Enquanto isso, nós temos uma breve conversa com o mecânico a respeito da situação da aeronave (um pneu foi substituído durante a noite), checamos todos os itens de segurança, verificamos se estão a bordo e adequadamente funcionando.
Uma inspeção visual externa é executada pelos pilotos, além daquela já feita pelo mecânico, mesmo lá fora, a uma temperatura de 2 graus e um vento cortante. De volta ao cockpit, inicia-se a programação dos computadores de bordo, onde toda a documentação entregue pelo DOV é inserida e conferida com o auxilio dos mesmos. 
Ouço, por frequência especifica de rádio, as informações meteorológicas e a pista em uso atual do aeroporto. Um briefing completo entre os pilotos é executado, itens como procedimento de subida, desaceleração, meteorologia, peso, bem como os briefings em caso de emergência são devidamente comentados e memorizados. 

A aeronave está perfeita, abastecida com 14.100 kg, embarque dos passageiros concluído, a carga nos porões devidamente acomodadas e as portas são fechadas. Inicia-se mais uma jornada técnica e divertida até nosso destino.

Check lists (lista de verificações) lidos e conferidos, e os motores são acionados. O mecânico sinaliza lá embaixo que tudo está OK, e o controle de solo nos autoriza o táxi até a cabeceira 17 direita. 

Durante essa lenta rolagem, mais alguns itens são conferidos, como situação dos controles de voo, posição de flap para decolagem, freios, e mais leitura de check-list. A visibilidade está muito boa e pontualmente, às 08 hs,  os motores são acelerados a uma potência aproximada de 95 por cento, e, ao atingimos 156 nós (289 km/h), deixamos a charmosa cidade para trás.


À esquerda, já contemplo a monstruosa altitude dos Andes, e após 13.000 pés (4.000 metros) de altitude, iniciamos nossa primeira curva à esquerda, na saída ALBAL UNO. Ainda em acentuada ascensão os motores fortes soam como música aos meus ouvidos, a aeronave se acelera para 250 nós (463 km/h), e posso admirar a beleza exuberante dos Andes à minha frente. E, para completar o show privilegiado de imagens, o nascer do sol, em mais alguns minutos, bem de frente à nossa cabine.

Estamos no rumo do território argentino e, nesse procedimento de subida, alguns itens extras de segurança são tomados, como manter os avisos de cintos de segurança ligados, comentar e seguir rigorosamente os procedimentos, em caso de uma despressurização ou falha em um dos motores, por exemplo, afinal estamos cruzando montanhas altíssimas, temos a segunda mais alta do mundo, o Aconcágua, 22.841 pés (6962 m), Cerro Colina 17.667 pés (5.353 m), Tupungato 21.555 pés (6.531 m), Maipo 17.270 pés (5.756 m) e, para completar a ideia, estamos ascendendo à 35.000 pés (10.606 m), mantendo velocidade de 300 nós (555 km/h).
Agora, com as montanhas à esquerda, e quinze minutos de voo, somos instruídos a chamar Mendoza, controlador que acompanhará nosso voo pela tela radar até próximo à divisa com a Argentina. Enquanto isso, os procedimentos burocráticos e técnicos são executados, a companhia é informada, via rádio, de nossa decolagem e hora prevista de chegada à São Paulo, nossos cálculos de navegação apontam que, para esse voo, estimamos 03 h 10 min até o destino, mantendo velocidade média de 540 nós (1000 km/h), em relação ao solo, o qual consumirá 8.386 kg de querosene de aviação ,aproximadamente, considerando um vento médio de cauda (nos “empurrando”) de 63 nós (117 km/h) e uma temperatura média externa de -51 graus Celsius, isso mesmo, bem gelado lá fora, já que se perde uma média de 2 graus C a cada 305 m que subimos. 

Devemos chegar a Guarulhos com aproximadamente 5.500 kg de combustível, já que, pelo regulamento, devemos ter o suficiente para chegarmos, ainda, a um aeroporto de alternativa, no nosso caso o Galeão no Rio de Janeiro, e ainda fazermos uma espera. 
Para que uma aeronave possa ser despachada, no mínimo dois aeroportos são escolhidos como alternativa, em caso de mau tempo ou fechamento do aeroporto de destino.

Atingimos nosso nível de voo de cruzeiro no horário previsto, e consumimos 2.480 kg de querosene e, no momento, estamos com pouco menos de 70.000 kg de peso total.

 Passando agora a posição TERON, 35 minutos mais tarde, passamos a nos comunicar com o controle de Córdoba, já no território Argentino. Estamos voando na aerovia UT650 até a cidade mencionada, depois com uma leve curva a direita ingressaremos na UM400, e nela permaneceremos até próximo a cidade de Santos em SP. 
Aerovias são nossas “rodovias aéreas”, com pontos e nomes definidos, as quais temos em nosso banco de dados, bem como mapas (chamadas de cartas) em papel, o qual conferimos nossa posição a todo instante.

Agora são 08 h 50 min da manha, o sol está muito brilhante à nossa frente, sobrevoamos Córdoba e ingressamos na aerovia mencionada. Nossos cálculos indicam um consumo de 3.470 kg de combustível, e temos um vento médio de 190 km/h nos ajudando (de cauda). Estamos degustando nosso café da manha, gentilmente servido pelo nosso chefe de equipe e, ao mesmo tempo recebemos informações de que temos tempo bom em Guarulhos, temperatura de 21 graus C e ventos favoráveis para pouso na pista 09 direita.
 Ao contrário do que muitos imaginam, embora a aeronave navegue o tempo todo com o piloto automático ligado, aliás, isso não é uma opção e sim um regulamento obrigatório, trabalhamos o tempo todo e pouco se olha para fora. Estamos agora organizando nosso cockpit, guardando as cartas de subida que utilizamos em Santiago, bem como as de procedimentos de emergência. O livro de bordo é aberto, e são anotados os dados do voo, bem como os nomes de todos os tripulantes a bordo.

Durante todo o tempo, temos que ter em mente qual procedimento tomar, e qual será o aeroporto mais próximo para se pousar, em caso de necessidade, lembrando que isso pode ser um passageiro ou um tripulante passando mal por exemplo, nem sempre é uma emergência operacional da aeronave. 

Lembrando que, para a decisão de tal pouso, o aeroporto escolhido deve comportar o peso de nossa aeronave, bem como deve possuir infraestrutura mínima, como escadas para o desembarque, por exemplo.
Atingimos a posição SIKOB, e chamamos o centro Resistência, controlador que nos observará nos radares até a divisa brasileira. Estamos mais leves, com 67 toneladas, 9.500 kg nos tanques e solicitamos ascensão ao nível 370 (37.000 pés, 11.212 m), já que aeronaves jato tem melhor eficiência a altas altitudes. 

Para entenderem melhor, vamos dizer que iniciamos a jornada em níveis mais baixos de altitude, e conforme vamos queimando querosene, estaremos mais leves e vamos solicitando níveis de voo mais altos, ao longo da rota. São 11 h 18 min, e aparece mais um presentinho para as nossas vistas, um Boeing 777 cruza à 330 m acima da nossa aeronave, em sentido contrário, na mesma aerovia, deixando sua esteira de condensação desenhada nos céus. Essa esteira é comumente confundida com fumaça pelos leigos, mas na verdade é uma nuvem formada quando o gás quente do escapamento dos motores se condensa em umidade sólida, em baixíssimas temperaturas. Claro que esse belo momento foi fotografado e filmado, já que os colegas até acenderam os faróis.
Outro detalhe, curioso, é que devemos tomar muita água durante nossas jornadas, visto que temos umidade relativa a aproximadamente 10 por cento na cabine, bem como pressão reduzida a 7100 pés, ou seja,  sensação de estarmos numa montanha e, sendo assim, vamos nos hidratando.

Agora são 09 h 30 min, avisto a cidade de Reconquista, na Argentina, logo à esquerda da rota e a cidade de Monte Caseros, no Uruguai à direita. Consumimos 5.300 kg de querosene, 200 kg a mais do previsto, devido às mudanças de vento, fato considerado normal e previsto. Com esse céu maravilhoso, vejo o contorno do rio Paraná dividindo a Argentina e o Uruguai e a visão vai até próximo a tríplice fronteira com o Brasil, dezenas de quilômetros à direita da rota.
São 09 h 42 min, cruzamos a fronteira com o Brasil e contatamos o centro Curitiba, órgão que estará conosco até próximo a São Paulo. Somos instruídos a trocar o código transponder para 3430, código esse que os controladores seguem no radar. O transponder é um equipamento que emite sinais numéricos para os controles de solo, bem como para outras aeronaves, sendo assim, também vemos no nosso radar outras aeronaves voando a nossa volta.

O centro Curitiba nos informa de tráfego logo atrás, voando na mesma aerovia com destino a Campinas e não devemos reduzir nossa velocidade. Trata-se de aeronave americana da Fedex (cargueiro), que decolou de Santiago, instantes depois de nós.

Quando passamos a falar com Curitiba, não mais se torna mais necessário a comunicação em inglês, já que estamos em território nacional. Visto que é a língua oficial na aviação, todas as aeronaves do planeta em território estrangeiro são obrigadas a utilizar-se do inglês técnico.

Sistemas da aeronave verificados novamente, motores operando na faixa verde, sem vibração e com níveis adequados de óleo. Sistema de pressurização OK, altitude de cabine em 7100 pés (2,151 m), isso significa que seu organismo sente que está a essa altitude. Sistema elétrico perfeito, geradores 1 e 2 fornecendo 115 V a 400 Hz, sendo utilizado 28 e 20 por cento de carga respectivamente. Essa aeronave possui 2 baterias de 24 V DC e estão recebendo carga retificada e com 47 A e 39 A respectivamente. Os 3 sistemas hidráulicos, responsáveis por auxiliar as superfícies de controle e trem de pouso (e outros), se comportam muito bem e estão pressurizados a 3000 psi cada. 
Os 5 tanques de combustível estão devidamente balanceados, com 710 kg de querosene nas pontas das asas, 2800 kg nas sessões intermediárias e, no momento, o tanque central está vazio. O sistema de ar condicionado está calibrado para fornecer confortáveis 22 graus Celsius nas 3 sessões na aeronave, e temos 1200 psi de pressão nas garrafas de oxigênio, aquelas que suprem as máscaras utilizadas em caso de despressurização. Isso dá um estimado de 15 min de utilização, o suficiente para a aeronave atingir uma altitude segura, onde se possa respirar sem as mesmas (geralmente 10.000 pés, 3.000 m).

Embora qualquer divergência venha a ocorrer, nós receberemos um alerta imediato, todos os parâmetros são observados, a fim de detectarmos algo fora dos padrões com antecedência.

São 10 h 40 min, consumimos 7.800 kg e temos ainda 6.100 kg. Estamos a 80 milhas (148 km) para iniciarmos a descida, 150 milhas (278 km) para o destino, quando ouço pelo rádio as informações meteorológicas, atualizadas, do aeroporto de Guarulhos. Temos tempo bom, 24 graus C e ventos favoráveis para pouso na 09 direita. 
Preencho nossa “landing computation”, no papel e em nossos computadores (dados meteorológicos e procedimentos que serão utilizados na aproximação e pouso). Nosso peso de pouso será de 62.900 kg, e nossa alternativa permanece o aeroporto do Galeão, no RJ, onde também temos tempo bom. Mais um briefing completo é feito, procedimentos utilizados na descida, aproximação e pouso, pista seca, frenagem, contingências em caso de emergência, e o que fazer em caso de arremetida (aproximação perdida) são comentados. 

Como observado, tudo planejado com antecedência, e temos agora em mente tudo que irá acontecer até o estacionamento nos portões. Iniciamos a descida as 10 h 47 min, 110 milhas (203 km) para o destino, vamos ingressar no procedimento STAR RONUT 1 para o ILS C2 da pista 09 direita (segue-se pelas cartas e computadores), o controle São Paulo nos instrui a reduzirmos nossa velocidade para 250 nós (463 km/h), descendo até 21.000 pés (6.363 m), devido ao grande congestionamento na chegada a São Paulo. 

O chefe de equipe nos informa que a cabine de passageiros está pronta, todos estão bem alimentados, alguns dormem, as vendas dos produtos do Duty Free estão encerradas e os procedimentos de segurança checados. Uma despedida formal via rádio é feita aos nossos passageiros, agradecendo por estarmos juntos nessa manhã. 

Avisto agora um grande congestionamento de navios para atracar no porto de Santos, já que temos boa visibilidade no litoral paulistano, embora a região do Grande ABC esteja encoberta. Contato a empresa via rádio, informando nosso horário de pouso, e solicitando duas cadeiras de roda para desembarque de 2 de nossos convidados. A empresa nos informa que a próxima programação dessa aeronave será um voo para Montevideo, e nós vamos aguardar 2 horas para então prosseguirmos em outra aeronave até Porto Alegre-RS. 
Agora cruzando a 10.000 pés (3.000 m), aviso de atar cintos ligados, faróis externos também ligados e entramos na fase de voo chamada cockpit sterile, onde é proibida qualquer conversa que não seja sobre nosso procedimento. Tal procedimento termina somente quando a aeronave estiver estacionada no portão. Somos o oitavo na fila para pouso, e a velocidade bem reduzida agora para o sequenciamento, 180 nós (330 km/h), 7.000 pés (2.121 m) de acordo com a controladora do controle final de Guarulhos. Sobrevoamos a Serra da Cantareira, e estamos cumprindo o “approach check list”, quando somos instruídos a curvar a esquerda, proa 140 graus, último vetor para alinharmos com a reta final para a pista 09 direita.
Temos a pista à vista, rodovia Ayrton Sena com tráfego intenso e, às 11 h 28 min, o pouso macio e seguro, seguido da desaceleração da aeronave. Onze minutos depois estamos estacionados, cumprindo os cheques para abandono, como é conhecido em nossa linguagem. Tudo deve estar em ordem, limpo e dentro das normas de segurança para que a próxima tripulação assuma a nave. 

Ao desembarcarmos, assim como os passageiros que chegam de um voo internacional, cumprimos as regras alfandegárias e de imigração. Após os trâmites, vou almoçar, me dirigir ao escritório da empresa e me preparar para, mais tarde, às 14 h 35min, cumprir outro voo, agora para Porto Alegre-RS. Como relatado, uma hora antes da decolagem, vamos consultar os dados meteorológicos, dados gerais do voo e da aeronave, e tudo se repetirá até a parada nos portões do aeroporto gaúcho, por volta das 16 h 30min. 

Com sorte, ainda vou curtir a vista das Serras Gaúchas e avistar as cidades de Canela e Gramado, que gosto muito, e aproveitando o horário de verão, fazer uma corrida no parque Farroupilha. Amanhã, ainda na madrugada, tudo recomeçará, teremos Porto Alegre-Guarulhos, Guarulhos-Porto Seguro-BA, retornando a São Paulo às 17 h 00 min. 
Posso imaginar o trânsito no final da tarde na capital paulistana, afinal vamos retornar a Congonhas, nossa base. Até que nossa missão de seis dias termine, ainda teremos Congonhas-Brasilia, Brasilia-São Paulo, São Paulo-Campo Grande (dormiremos nessa cidade), chegando a meia noite. Na tarde de sexta-feira, Campo Grande-São Paulo, São Paulo São José do Rio Preto, São José do Rio Preto- São Paulo finalizando às 22 h 30 min.

Quando em São Paulo, dividimos apartamento com outros pilotos bem próximos ao Aeroporto, já que nossas residências ficam em outros estados, Brasil afora. 

Sábado, vou frequentar sala de aula o dia todo, e, finalmente, à noite, volto ao meu lar no Paraná. E os leitores devem estar se perguntando, quantos dias de folga? A resposta é: apenas um dia, isso mesmo, um dia apenas, e segunda-feira saio para mais uma missão de quatro dias.

Espero que tenham gostado do artigo.

* * *

O autor do artigo, RICHARD FERNANDES, é comandante de Airbus A320